domingo, 7 de setembro de 2008

* DESENHO


Fui morena e magrinha como qualquer polinésia,

e comia mamão, e mirava a flor da goiaba.
E as lágrimas me espiavam, entre os tijolos e as trepadeiras,
e as teias de aranha nas minhas árvores se entrelaçavam

Isso era um lugar de sol e nuvens brancas,
onde as rolas, à tarde, soluçavam mui saudosas...
O eco, burlão, de pedra, ia saltando,
entre vastas mangueiras que choviam ruivas horas.

Os pavões caminhavam tão naturais por meu caminho,
e os pombos tão felizes se alimentavam pelas escadas,
que era desnecessário crescer, pensar, escrever poemas,
pois a vida completa e bela e terna ali já estava.

Com a chuva caía das grossas nuvens, perfumosa!
E o papagaio como ficava sonolento!
O relógio era festa de ouro; e os gatos enigmáticos
fechavam os olhos, quando queriam caçar o tempo.

Vinham morcegos, à noite, picar os sapotis maduros,
e os grandes cães ladravam como nas noites do Império.
Mariposas, jasmins, tinhorões, vaga-lumes
moravam nos jardins sussurrantes e eternos.

E minha avó cantava e cosia.
Cantava canções de mar e de arvoredo, em língua antiga.
E eu sempre acreditei que havia música em seus dedos
e palavras de amor em minha roupa escritas.

Minha vida começa num vergel colorido,
por onde as noites eram só de luar e estrelas.
Levai-me aonde quiserdes! - aprendi com as primaveras
a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira.


Cecília Meireles



3 comentários:

Anônimo disse...

Esse lugar ai do poema me passa uma calma.
Num há nada mais belo que a natureza, que até em sua feiura é bela.

=)

gugapiva disse...

colombina, colombina!

Renato Sant'Anna disse...

Olá! estou lendo aos poucos... mas tudo q vc escreve é mt bom!!
to fazendo um pra mim... sobre musica brasileira... e coloquei o link para o seu la, pois gostei mt!
pode??
depois te passo o link, nao escrevi nada ainda...
beijao ye!